Os Participantes do Simpósio Nacional em Sociodeducação, realizado nos dias 8, 9 e 10.nov, em Brasília, divulgam Carta Aberta

 

 

 

 

Carta Aberta

 


Nós, participantes do Simpósio Nacional de Socioeducação e integrantes da Rede Nacional de Pesquisadores em Socioeducação, nos dirigimos à sociedade brasileira e especialmente para: MDH; MEC; MDS; CNE; CONSED; UNDIME; UNCME; CNJ; CNPM; CONANDA; FONACRIAD; MJ; FONAJUV; Gestores das medidas socioeducativas de Semiliberdade e Internação em Estabelecimento Educacional; Gestores das medidas de Liberdade Assistida e Prestação de Serviços a Comunidade; adolescentes e jovens que cumprem ou já cumpriram medidas socioeducativas e suas famílias; pesquisadores, profissionais e estudantes do campo da socioeducação; e a Comissão Especial sobre Revisão das Medidas Socioeducativas da Câmara dos Deputados.

 


Vivenciamos, no Brasil, uma realidade socioeconômica de profundas desigualdades sociais, pobreza e desrespeito aos diretos dos adolescentes e jovens. De modo recorrente tem-se destinado aos adolescentes e jovens autores de atos infracionais discurso preconceituoso, produzido pelo moralismo e senso comum. As adolescências em situação de sofrimento são culpabilizadas e criminalizadas em função de pertencimento étnico-racial, gênero, situação de pobreza, territórios periféricos, o que gera ódio e desprezo.


Em consequência deste conjunto de violências, surgem propostas legislativas de diminuição da idade penal, aumento do tempo de internação, encarceramento e punição dos adolescentes. Identificamos uma pulverização de políticas e um rompimento perverso com as prerrogativas da Constituição Federal e legislação vigente. Entretanto, nós, do campo socioeducativo, consideramos que os adolescentes brasileiros estão ávidos por reconstruir histórias de vida. Isso exige a elaboração de alternativas aos discursos totalizantes e institucionalizantes que precarizam projetos e planos que não atingem a realidade dos adolescentes que cumprem medidas socioeducativas.


Diante desse desafio, os 580 participantes do Simpósio Nacional em Socioeducação: a escolarização e o atendimento socioeducativo em perspectiva, reunidos em Brasília, de 8 a 10 de novembro de 2017, vimos defender as seguintes prioridades:

 


1. CUMPRIMENTO DOS MARCOS LEGAIS. As Normativas Internacionais de Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes no Sistema de Justiça Juvenil, a Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Resolução nº 119/2006 do CONANDA e a Lei nº 12.594/2012, que instituem o SINASE, não vêm sendo efetivamente cumpridos, resultando em prejuízos perversos a adolescentes e à sociedade em geral.

 


2. PREVALÊNCIA DA DIMENSÃO EDUCACIONAL E PEDAGÓGICA SOBRE A PUNITIVA DAS MEDIDAS. Instituições socioeducativas têm realizado o atendimento de modo a priorizar o caráter punitivo em detrimento do educacional, contrariando as determinações do SINASE, das Diretrizes Nacionais para Atendimento Escolar de Adolescentes e Jovens em Cumprimento de Medidas Socioeducativa, Resolução CNE nº 03/2016 e das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial e Continuada dos Profissionais do Magistério da Educação Básica, Resolução CNE n° 02/2015.


3. GESTÃO PARTICIPATIVA E DEMOCRÁTICA. Espera-se do Sistema Socioeducativo a efetivação de relações horizontais, através de Equipes Multiprofissionais e Multidisciplinares, de caráter Interdisciplinar, conforme preconizado pelo SINASE e pelas Diretrizes do CNE. A gestão autoritária reproduz a supervalorização da segurança e compromete a dimensão educacional das medidas socioeducativas.

 

4. POLÍTICA INTEGRADA DE GESTÃO DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO. O Plano Nacional Decenal de Atendimento Socioeducativo estabelece a articulação interministerial, no nível federal, e entre secretarias dos estados e municípios visando à unificação do atendimento. A separação entre a gestão das medidas privativas de liberdade e as de meio aberto prejudica a dimensão educacional do atendimento socioeducativo.

 


5. INSTALAÇÃO DE FÓRUM NACIONAL INTEGRADO DE TODAS AS MEDIDAS
SOCIOEDUCATIVAS, representando todas as instituições que atendem medidas privativas e não privativas de liberdade.

 


6. REPÚDIO A QUALQUER TENTATIVA DE REDUZIR A MAIORIDADE E AMPLIAR O
TEMPO DE INTERNAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E O ECA. Esse retrocesso vai prejudicar a vida e a educação de dezenas de milhares de adolescentes, os quais terão sua trajetória de desenvolvimento comprometida.

 


7. ÊNFASE NO PAPEL DAS UNIVERSIDADES E INSTITUIÇÕES DE ENSINO NA
FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA SOCIOEDUCAÇÃO. A partir do alinhamento teórico, conceitual e metodológico que fundamenta a política socioeducativa brasileira, assegurar a formação inicial e continuada para os profissionais e gestores do sistema socioeducativo, integrada à Escola Nacional de Socioeducação.

 


8. INSTITUIÇÃO EFETIVA DA REDE NACIONAL DE PESQUISADORES EM SOCIOEDUCAÇÃO, iniciada neste Simpósio Nacional, agrupando pluralidade de instituições, para produzir e analisar informações, de forma comprometida com a garantia dos direitos dos adolescentes.

 


9. PARTICIPAÇÃO DOS ADOLESCENTES EM TODAS AS FASES DA CONSTRUÇÃO DA POLÍTICA SOCIOEDUCATIVA, promovendo o protagonismo e a cidadania desses sujeitos e seus familiares.

 


10. PRIORIZAÇÃO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCTIVAS NÃO RESTRITIVAS DE LIBERDADE, garantindo a excepcionalidade e brevidade da medida de internação em estabelecimento educacional, conforme o ECA.

 


11. VALORIZAÇÃO DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E DE GESTÃO ESCOLAR ESPECÍFICAS À REALIDADE SOCIOEDUCATIVA, necessárias à garantia das aprendizagens e pleno desenvolvimento dos adolescentes e jovens.

 


Brasília, 10 de novembro de 2017


Participantes do Simpósio Nacional em Socioeducação: a escolarização e o atendimento socioeducativo em perspectiva