22/09/2017 - Gustavo Codas

 

 

Em setembro deste ano faz 150 anos da publicação da primeira edição do volume 1 do livro O CapitalCrítica da economia política, de Carlos Marx (1818-1883). O autor não viveria para conseguir publicar os dois volumes seguintes (2, 1885; 3, 1894), tarefa realizada pelo seu camarada Federico Engels (1820-1895).

 

Obra fundamental do pensamento revolucionário, foi pouco lida. No Brasil somente foi traduzida e publicada cento e um anos depois da sua primeira edição em alemão. Até então o que estava mais acessível no país eram traduções em espanhol publicadas na Argentina e no México. Os afamados “Seminários Marx” de leitura de O Capital na USP, no final dos anos 1950 e início da década seguinte, foram sem dúvida um “ponto fora da curva” intelectual da esquerda, ainda que restrita à academia.

 

Uma certa leitura dominante em nível internacional havia levado a um dogmatismo oco, coincidente com o controle estalinista do movimento comunista internacional; para comprová-lo, basta revisar os manuais soviéticos publicados entre 1930 e 1980, hoje fora de circulação até mesmo nos sebos. No caso do “marxismo ocidental”, sua mira foi desfocada, apontando apenas à filosofia e à cultura.

 

A morte do Che Guevara, em 1967, e o fim do projeto da revista Pensamiento Crítico (1967-1971) em Cuba recortaram horizontes teóricos à revolução cubana, que até então se nutria de todo o debate revolucionário internacional e buscava raízes próprias, cubanas e latino-americanas. O “Quinquênio Cinzento” (1971-1975) trouxe de volta à ilha a chatice dos manuais soviéticos.

 

O auge do neoliberalismo e o fim do “socialismo real” pareceram sepultar Marx no final dos anos 1980 e na década seguinte. No Brasil dos anos 1990, sobrou uma melancólica discussão: o FHC leitor marxista daqueles seminários na USP era o mesmo FHC neoliberal que estava governando nos 1990 ou teria ele pronunciado de fato a famosa prece em forma de epitáfio intelectual: “esqueçam o que eu escrevi”?.

 

Mas as turbulências do capitalismo no presente século e sua grande crise internacional de 2007-8 fizeram reaparecer o livro nas prateleiras. Jornais de negócios de países capitalistas desenvolvidos e grandes especuladores com alguma leitura reconheceram a vigência de sua análise crítica do funcionamento da economia capitalista. Marx e sua obra magna voltaram.

 

Hoje temos no Brasil três edições do livro. Há cursos disponíveis no Youtube para adentrar-se em seu estudo. Há livros que servem de apoio para a leitura. O Capital tem, provavelmente, mais prestígio acadêmico atualmente que nunca na história da universidade brasileira. Nada mal para uma obra de difícil leitura, com todos esses anos. E volta num momento em que é possível cruzar seu conteúdo com novas teorias críticas da sociedade atual, por exemplo, do feminismo de esquerda ou do ecologismo anticapitalista.

 

Mas falta hoje o que era o fundamental para Marx e Engels. Que sua obra fosse uma ferramenta para a luta da classe trabalhadora. Que seu método fosse utilizado não somente para analisar o capitalismo em livros, seminários e blogs, mas sobretudo para orientar a ação das classes exploradas e oprimidas para derrotar à burguesia e iniciar a construção de uma sociedade pós capitalista, o socialismo.

 

 

Serviço

1. Edições brasileiras de O Capital, de Carlos Marx
(tomando por referência a primeira edição do volume I):
* Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1968.
* São Paulo, Coleção Os Economistas, Editora Abril, 1983.
* São Paulo, Boitempo, 2014.

 

2. Para um estudo introdutório da obra.
Video curso Introdução ao estudo de O Capital,
com Reinaldo Carcanholo, na Escola Nacional Florestan Fernandes, 2010 https://www.youtube.com/watch?v=Sk11gl6xwmg
Mais Marx. Material de apoio à leitura d'O capital, Livro I.,
de  Anne Steckner, Antonella Muzzupappa, Ingo Stutzle, Sabine Nuss e Valéria Bruschi.
São Paulo, Boitempo Ed./ Fund. Rosa Luxemburg, 2017.

 

3. Para novas leituras.
Feminismo. Calibã e a bruxa. Silvia Federici. São Paulo: Ed. Elefante, 2017
Ecologia. A ecologia de Marx. Materialismo e natureza. John Bellamy Foster. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2005